Investigadora escreve obra sobre "O tempo das criadas"

A investigadora Inês Brasão defende, na obra "O tempo das criadas", editada esta semana, que as empregadas domésticas são "uma questão central na história privada em Portugal", apesar de "a memória coletiva" as relegar "para um passado imaginário".
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A obra "O tempo das criadas - A condição servil em Portugal (1940-1970)", editada pela Tinta da China, pretende, argumenta a autora, "lançar luz sobre a natureza de relacionamento dos criados com os patrões".

Outro objetivo é "esclarecer qual a natureza e quais os códigos de tratamento, bem como compreender a sua [das criadas] origem social, os hábitos, os usos do corpo, a linguagem, as debilidades e as relações com o espaço e o tempo".

Os "textos produzidos pelas organizações do Estado Novo [1933-1974]" ensinavam "às jovens portuguesas que as suas criadas mereciam caridade, voz firme e olho vivo".

As criadas, escreve a investigadora, eram habitualmente apontadas pela "desobediência, preguiça [e] sujidade".

O livro é "um retrato do serviço doméstico em Portugal", referindo o "movimento generalizado de captação das criadas internas para o universo familiar urbano".

As criadas eram procuradas nas zonas rurais, com idades entre o sete e os dezassete anos, sendo na sua maioria analfabetas, ou com habilitações literárias que não ultrapassavam a quarta classe do ensino primário.

No período em foco, o trabalho doméstico, em que a empregada vive dentro da habitação da família, "assume proporções inéditas e suscita manifesta perturbação da ordem familiar", começando a declinar só na década de 1960.

Todavia, as criadas apresentavam-se como "essenciais", na medida em que "a família moderna só podia consolidar-se mediante a incorporação de um indivíduo que assegurasse a gestão da casa".

A obra inclui não só a investigação de várias fontes documentais, nomeadamente as publicações a Voz das Criadas e Bem Fazer, como relatos orais de antigas criadas - uma delas desempenha atualmente as funções de juiz.

Inês Brasão conta resumidamente 18 biografias de antigas criadas. Uma delas tem mesmo direito a um capítulo e é apresentada sob o pseudónimo de Maria Mendes.

A obra visa igualmente "confrontar as protagonistas" com a construção social que era então feita das criadas, nomeadamente que tinham "pretensões de imitação de classe de quem serviam, impropriedade linguística, carentes de higiene moral e física, hábitos pouco católicos, incapacidade de cuidar dos outros e falta de produtividade".

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